terça-feira, 25 de março de 2008

A escola real (VIII)


Actualiza regularmente a sua página do Hi5 e assim vai mantendo o contacto com os amigos e fazendo outros, através daqueles que acedam ao seu domínio virtual. Nas redes sociais podem-se fazer amigos numa progressão exponencial: basta que o amigo do amigo tenha o endereço do primo do vizinho para que um jovem filho de emigrantes na Austrália aceda à página pessoal de um outro cuja vida decorre algures, na planície ondulada alentejana, e para que estes dois jovens passem a integrar um grupo, cada vez menos restrito, de cibernautas que partilham interesses e se consideram, enfim, amigos, num processo que mais parece coleccionismo de afectos, sem grande critério que não seja o quantitativo.

Tem apenas 12 anos e respira o mesmo ar que é possível ser respirado nessa imensidão de verde que a foto revela ( captada domingo de Páscoa ). Mora nas faldas do relevo suave que domina o plano recuado da paisagem. O rosto é a fotocópia da mãe mas em tudo o resto parece , já, a reprodução , versão século XXI, do percurso de vida do Pai: comunica através de vocábulos quase incompreensíveis a comporta-se conforme a extrema rudeza do campónio. Nutre uma aversão, dir-se-ia atávica, à escola, que vai sendo mais evidente à medida que o insucesso se vai instalando. Falta às visitas de estudo por desinteresse, com o assentimento tácito dos progenitores. Paralelamente vai miscigenando, corpo e alma , com hábitos ancestrais. Ligam-no , já, à terra, aqueles laços que se foram forjando pelas gerações que dela sabem vir o sustento. É uma relação que rapidamente se torna muito mais afectiva do que de mero interesse: uma forma , essencial, de amar.
Soube-o domingo: o Pedro é já o criador do mais belo faval da localidade. Dizem-no os homens e , principalmente, as mulheres que cobiçam o produto. O Pai deu-lhe um cabra e dois cabritinhos que são pelo jovem criados com cuidados de puro profissional. Nada falta aos herbívoros: desde uma cerca que o Pedro construiu com esmero até todo o potencial de um crescimento saudável que a boa alimentação fornece. Enquanto isso vai-se tornando num mestre-artesão, autor de miniaturas perfeitas que retratam o imaginário milenar daquela gente. Acompanha o Pai nos fretes que este faz enquanto sócio de uma empresa familiar de camionagem: vai-se fazendo um especialista em desvendar os segredos escondidos nesses monstros motorizados. Em tais preparos , a escola tornou-se, para ele, um mero acidente de percurso que os pais, aliás, tudo fazem para desvalorizar.

A questão é: o Pedro desenvolveu competências ao nível do saber-fazer e do empreendedorismo e demonstra um potencial notável para as rentabilizar de futuro. Como explicar, neste quadro, o divórcio precoce que o jovem contratualizou com a escola?

1 comentário:

Anónimo disse...

Estou a imaginá-lo na escola, em luta com a professora, agarrando a pata traseira do herbívoro:
- DÁ-ME A MINHA CABRA, JÁ!!!

O fartleker